quinta-feira, 26 de fevereiro de 2015

A HUMILDADE NA QUARESMA


Entramos na Quaresma 2015 e a melhor maneira de entrar nela é pedir a humildade. Não pedimos a humilhação porque esta perverte e destrói, mas a humildade que é a verdade e a justeza humana e espiritual de que todos nós temos sede.

Durante este Quaresma, entremos no deserto e façamos memória daquilo que nos diz o profeta Oseias (Os.2), quando nos recorda que o Senhor conduziu Israel ao deserto para lhe falar ao coração. Só no espaço enorme do deserto podemos abrir o coração e dialogar com Aquele que nos ama. Ali, onde o silêncio é plano, se aprende a escutar os nossos gemidos interiores e quem é que os não tem, mas também nos chegam com maior acuidade os gemidos do mundo e como o mundo geme ferido pelas guerras, amarrado pelas servidões de todo o género!

Nesta Quaresma, apoiemos a nossa vida nos três pilares de que nos fala o Evangelho de S. Mateus de Quarta Feira de Cinzas: a ORAÇÃO que nos faz escutar a Deus, nos revela o nosso mal, no confronto com a tentação, mas nos revela também o Amor de Deus e a força do alto, o Espírito Santo. Não foi o Espírito Santo que impeliu Jesus para o deserto (Mc.1,12)? Com a força do Espírito, sairemos, como Jesus, vencedores da tentação da riqueza (faz que estas pedras se convertam em pão, 1ª tentação), do poder (tudo isto te darei, se prostrado me adorares, 2ª tentação) e da invulnerabilidade (deita-te daqui abaixo que os anjos de Deus virão em teu auxílio, 3ª tentação); o JEJUM que nos ajuda a escutar-nos a nós mesmos, e aferir a nossa relação com as coisas, isto é: as coisas são criadas para, através delas, louvarmos e reverenciarmos Aquele que as criou ou colocou ao nosso serviço; colocar as coisas ao serviço da vida espiritual; vencer, se acaso é necessário, depois dum discernimento, as afeições desordenadas para com as coisas e pessoas; a ESMOLA que me faz escutar os outros que gritam por um pedaço de pão material, porque têm fome e porque gritam também por outro pão não menos necessário: a consolação, a esperança e a confiança que depositam na minha amizade e entrega.

Nesta Quaresma, aproveitemos para retomarmos o nosso espírito, não para fazermos alguma penitência especial, mas para a elevação gradual do nosso coração para a contemplação de Deus Pai que nos criou, nos deu o seu Filho Jesus e nos santifica no Espírito Santo, porque a contemplação não é somente dos místicos, mas de todos os simples de coração. Tomemos a Quaresma como um tempo de libertação, um espaço para respirarmos, para libertar o nosso coração das angústias e dos medos, dos fantasmas que criamos. Aproveitemos também para revisitarmos os nossos hábitos. Quais são os que me tiram a independência e que não nos deixam voltar ao essencial, ao fundamental? Pensemos: encontramos tempo para falar, para sentar-nos e resolver a dois ou a três os nossos problemas? Ou mergulhamos, noite dentro, na Televisão, no Computador, na Internet e Facebook, sem uma palavra para o companheiro ou companheira que está a nosso lado e sem nos darmos conta até que, no dia seguinte temos um dia de trabalho e um compromisso social.

E, no silêncio da noite, a Quaresma convida-nos a repousar placidamente e a mantermo-nos vigilantes para não consentirmos os pensamentos “negativos” mas sim os pensamentos “positivos”, aqueles que, à maneira duma luz radiosa, alimentem a nossa esperança e nos fazem levantar as mãos para o Senhor que dá. Se pedimos e temos o coração aberto e as mãos estendidas para receber, o Senhor nos ensina a humildade e a humildade nos abre à verdade do nosso ser e daquilo que é a vida verdadeira. É preciso nesta Quaresma pedir e pedir sempre, porque pedir é reconhecer que eu não me dou a vida a mim mesmo, mas consinto em recebê-la e abrir-me à verdadeira Fonte. E a Fonte da vida jorra do lado aberto do Senhor que eu contemplo no alto da Cruz na Sexta-feira Santa e que na noite da Páscoa me transfigura com Ele. Não celebramos nós neste Domingo o Domingo da Transfiguração? Da antecipação da Ressurreição?

Concluímos: viver a Quaresma é colocar-nos à escuta do Espírito Santo. A Quaresma um dom a receber e não muitas coisas a fazer, embora estas são necessárias como nos aponta o Papa Francisco ao falar-nos na Mensagem para ao Quaresma que é necessário combater a indiferença e olhar para o outro. A nossa atenção aos outros, as nossas partilhas no grupos do C. V. X., nas Equipas de Nossa Senhora, no C.P.M. e noutros Movimentos das comunidades das nossas Paróquias devem ser enraizados em Jesus Cristo e num desejo grande de oração. Então, o Senhor poderá purificar o nosso olhar, abrir as nossas mãos, unificar as nossas riquezas e capacidades para as colocarmos ao serviço dos outros das nossas famílias e das mossas comunidades paroquiais. Assim a Quaresma elevada a este nível nos indica o caminho do despojamento do nossa egoísmo, do nosso “eu”. E não tenhamos medo de comprometer-nos por este caminho de verdade que é o caminho da Humildade.


Padre José Augusto Alves  de Sousa, SJ

Imagem do filme Il Vangelo secondo Matteo, Pier Paolo Pasolini.

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